
Fundação Movimento de Corais Canto das Artes - 50 anos de sonhos, lutas e realizações
O meu olhar como estudante e professor sobre o trabalho da Fundação Movimento de Corais Canto das Artes em seu aniversário de 50 anos.
Por Sérgio Gomes Carvalho:
Falar sobre o trabalho da Fundação Canto das Artes é se referir a dedicação, amor ao próximo e luta incansável pela inclusão social através da arte, sobretudo da música.
A Fundação Canto das Artes não é uma instituição que surgiu como uma sigla idealizada por um grupo de indivíduos, ela nasceu de modo não programado como resultado do legado da professora Leniza Souza Santos que vem se dedicando à causa cultural e artística nesses 50 anos, com um trabalho de inclusão que beneficia pessoas dando acesso ao aprendizado da música clássica e popular e de outras artes, com os seus vários instrumentos e linguagens. Também através do resgate da cultura popular pela valorização da memória e do folclore. Esse foi um trabalho que, inicialmente, comungava o ensino de Arte na educação escolar convencional com o trabalho filantrópico extraescolar numa conexão que foi revelando os primeiros multiplicadores deste ideal. É sob esse olhar que observo a Fundação Canto das Artes como uma família que vem sendo construída e se solidificando por todos esses anos.
Falarei da minha experiência como aluno que reconhece a importância que esse trabalho teve para a minha vida, tanto para o despertar artístico e profissional, quanto como forma de inclusão social, uma vez que, muitas vezes, as crianças pobres como eu fui, não encontram algo ou alguém que as direcione a acreditar que podem vencer na vida se forem dedicadas, tiverem alvo e fé, princípios que sempre foram cativados por esta Fundação.
Eu conheci o trabalho da professora Leniza no ano de 1982, quando iniciei o ginásio (hoje fundamental II) na antiga 5ª série, na Escola Polivalente de Itapetinga, quando ela foi a minha professora de Arte pela primeira vez. Logo compreendi que o seu trabalho não se tratava de uma mera disciplina escolar que se ocupava simplesmente da aprendizagem, porque apontava para algo mais além. Aquelas aulas nos abria o universo da arte na sua diversidade e ficávamos encantados em participar de atividades de canto, de pintura, de escultura, de dança e de apresentações que envolvia as várias linguagens artísticas, sempre voltadas para temas de valorização da arte e conservação da cultura. Porém, mas que isso, nos preparava para a valorização do ser humano e para a vida; pude perceber isso pelas atividades que eram feitas dentro e fora da escola.
O trabalho da professora Leniza despertava, em nós alunos, o amor pelo fazer artístico, ao mesmo tempo que nos ensinava a importância da arte na construção de um caráter que valoriza o bem, a paz e a dedicação em favor do outro. Aquelas inesquecíveis aulas de arte eram tão envolventes que nos sentíamos inteiramente em casa, lugar onde o tempo parecia passar mais rápido e não queríamos que acabasse. Era tão envolvente a ludicidade daquelas atividades de pintura de quadros, canto com cantigas populares, danças de rodas, coreografias, bumba meu boi, dramatizações, etc. Eu tive o privilégio de desfrutar desse ambiente de formação estética durante os quatro anos do meu período ginasial.
Como já sinalizei, o trabalho da professora Leniza não era restrito à escola onde trabalhava, ela dirigia outros grupos artísticos na área de música em várias instituições da cidade de modo filantrópico e, sempre que possível, convidava os seus alunos para participarem de eventos nesses lugares e ficávamos felizes em participar. Esse tipo de atividade continua sendo feita pela Fundação Canto das Artes até hoje. Esses trabalhos realizados em igrejas, abrigo de idosos, hospitais e outros, demonstram a importância da arte como instrumento de humanização e inclusão, tanto dos que promovem, quanto dos que são chamados a participar.
Acredito que o fio condutor para eu ter me tornado um professor de Arte (atuante a mais de 30 anos) tenha sido por conta dessa experiência que tive como aluno da professora Leniza no período de minha adolescência na escola e em outros envolvimentos com o trabalho da Fundação Canto das Artes. Tenho trabalhado como professor na educação regular, em escolas públicas e privadas, mas também tive a oportunidade de trabalhar por vários anos na Fundação Canto dos Artes, na área de Arte, até porque é um dos propósitos da Fundação transformar alunos em monitores, e posso testemunhar do brilhante trabalho que essa instituição tem feito nesses vários anos na cidade de Itapetinga e em outras cidades, e dos milhares de alunos que tem se beneficiado desse trabalho.
É maravilhoso ver crianças de baixa renda e residentes em locais de alta vulnerabilidade social, onde as pessoas quase não têm nenhuma perspectiva de vida e nem o direito de sonhar, ter a oportunidade de aprender música clássica em seus vários instrumentos e conhecer a arte e o valor da cultura; ver idosos serem inseridos como pessoas ativas culturalmente e valorizadas por seus conhecimentos acumulados durante a vida, mantendo acesa a chama da criatividade e produtividade artísticas; tudo isso é a Fundação Canto das Artes.
Infelizmente a valorização da arte e da cultura é ainda extremamente tímida na nossa sociedade que privilegia outros valores ditos "mais importantes" e, com isso, trabalhos tão importantes como o da Fundação Canto das Artes, quase sempre, passam por grandes dificuldades financeira para se sustentarem. Talvez esse seja o principal ponto vulnerável do trabalho que se dedica ao resgate de vidas e não a outras causas sociais compatíveis ao mundo financeiro e ao lucro que massifica as pessoas e exclui as individualidades.
Nesse aniversário de 50 anos da Fundação Canto das Artes, essa instituição que muito fez e continua a fazer, pela cultura, pela arte e pela inclusão social em Itapetinga, poderia receber vários presentes, mas não poderia haver presente mais digno que o reconhecimento daqueles que, como eu, já foi beneficiado por esse trabalho tão importante para a minha formação como arte-educador. Também acredito que não poderia haver presente melhor por parte das instituições governamentais municipais e outras, que a mão estendida sob forma de parceria e apoio para que esse trabalho tenha continuidade e não seja tolhido pela falta de recursos.
